O Neurônio Viciado


                 A oscilação lenta (SO) consiste em uma mudança de estado das células do córtex cerebral (entre polarizado e despolarizado) observada em períodos de menor atividade do cérebro, como em sono profundo ou anestesia. Os estados se alternam numa frequência na faixa de 0.2 a 1 Hz e é importante a consolidação e formação de memória de longo-prazo, através da criação e do reforço de redes neurais (principalmente de caráter dopaminérgico).
                A cocaína é um éster do ácido benzoico outrora utilizado como anestésico local, hoje conhecido como uma potente droga recreativa estimulante. A cocaína age inibindo a recaptação de diversos neurotransmissores, especialmente as catecolaminas, como dopamina (DA) e noradrenalina (NA). O reforço para sua utilização e posterior adicção se dá por estruturas que compõem o “centro de recompensa”, como a Área Tegmentar Ventral (VTA).

                Neste artigo foi  experimentado se a cocaína exerce influência sobre a SO na VTA e a sua potência em indivíduos que já apresentam adicção à droga. Inicialmente, para determinar que animais haviam se tornado adictos, fez-se uma análise de comportamento de ratos que haviam recebido injeções de uma solução de cocaína, comparando com um grupo-controle que recebeu apenas uma solução salina. A análise se baseava na agitação dos ratos (relacionando à sensibilização locomotora, SL) observada por câmeras e proporção de adictos-não adictos, nos ratos tratados foi de 60-40%. Nos ratos não tratados, o percentual de “adictos” (apresentaram agitação progressivamente maior) foi de cerca de 20%.
                Após a determinar que animais já apresentavam SL, passou-se para a segunda etapa do experimento: medir a atividade neural da VTA. Foi observada nos ratos do grupo controle uma atividade significativamente menor que dos ratos adictos um dia depois do fim da fase de tratamento com cocaína. Em seguida verificou-se que, no mesmo intervalo de tempo, tanto a atividade de neurônios dopaminérgicos (Neurônios DA) quanto neurônios não dopaminérgicos (Neurônios não-DA) tiveram suas atividades aumentadas de forma significativa, indicando correlação. Entretanto, uma nova observação, feita 14 dias depois, mostrou que os neurônios DA continuaram com sua atividade aumentada, enquanto os neurônios não-DA deixaram de apresentar este incremento, perdendo assim a correlação com o passar do tempo. Isso demonstra que a cocaína pode agir aumentando a atividade dopaminérgica do VTA, e mesmo depois de um período de abstinência, ainda assim há influência nestes neurônios.
                Estes resultados podem, por exemplo, explicar o porquê do vício em cocaína ser tão difícil de ser combatido: as atividades relacionadas à memória de recompensa são intensificadas e mesmo sem usá-las o reforço ao hábito de consumir cocaína se mostram muito presentes.

Por Marcos Otavio e Pedro da Silva e Diego Aguiar

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