O cérebro de um campeão

Por quase três décadas pesquisadores têm buscado compreender melhor os fatores que diferenciam atletas de alto rendimento (considerados experts), de novatos e não-atletas. Hoje sabemos que a atividade física altera a estrutura e o funcionamento do cérebro. No entanto, ainda não está claro como o treinamento esportivo em longo prazo afeta a cognição dos atletas. A cognição é o processo através do qual nós adquirimos conhecimento; ela envolve habilidades como percepção, atenção, memória, raciocínio, imaginação e linguagem.

Ao longo dos últimos 15 anos, o voleibol brasileiro dominou o mundo, sendo uma modalidade esportiva com uma grande demanda cognitiva. É um esporte que exige deslocamentos sincronizados entre os membros de uma mesma equipe, tanto com a posse quanto sem a posse da bola, no sentido de atacar ou se defender, respectivamente. Além disso, requer dos atletas uma habilidade elevada no trato com a bola, através de diferentes fundamentos (saque, defesa, levantamento, manchete, bloqueio e ataque). Ao longo de uma partida, os jogadores precisam prever as ações de jogo que vão evoluindo e se antecipar para aplicar a técnica adequada. Isto implica na implementação de soluções cognitivas imediatas e precisas para obter êxito em cada etapa do jogo.

Mas, afinal, o que medalhistas olímpicos têm de diferente? O que acontece com o cérebro de um atleta de alto rendimento?


Com esta pergunta em mente, os pesquisadores Heloisa Alves, Victor Cossich e José Inácio Salles (PNeuro/INTO), em parceria com a Confederação Brasileira de Voleibol (CBV) e com a Universidade de Illinois nos EUA, visitaram o Centro de Desenvolvimento de Voleibol (CDV) em Saquarema em 2008, alguns meses antes das Olimpíadas de Beijing. Lá, eles avaliaram 87 jogadores profissionais de voleibol, de 6 seleções diferentes (masculina e feminina, de base e adulta). Com o auxílio de computadores e software especializado, os pesquisadores avaliaram o funcionamento cognitivo dos atletas através de testes de atenção, memória e flexibilidade cognitiva.

Eles descobriram que os atletas eram capazes de inibir seu comportamento, ou seja, parar rapidamente uma ação quando precisavam, o que é fundamental no esporte e na vida diária. Eles também eram capazes de captar informações no ambiente e alternar entre tarefas de forma mais precisa e rápida do que não-atletas.

Outro resultado interessante foi que no grupo de atletas, não houve diferença de desempenho entre os homens e as mulheres. Entretanto, no grupo de não-atletas, o desempenho dos homens foi bem melhor do que o das mulheres. Ou seja, parece que o esporte iguala os gêneros em termos do desempenho mental. Em outras palavras, no esporte de alto rendimento (pelo menos no voleibol), parece não haver diferença entre o cérebro de uma mulher e o cérebro de um homem.

Mas uma questão crucial permanece: atletas são superiores por causa do treinamento ou por causa de alguma vantagem genética? É inato ou aprendido? Provavelmente um pouco de cada coisa. Novas pesquisas precisam ser desenvolvidas no futuro para que se chegue a uma conclusão definitiva.

Os resultados desta pesquisa foram divulgados em diversos blogs no exterior e publicados na revista Frontiers of Movement Science and Sport Psychology em 2013.



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